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O impacto do depósito de armas nucleares russas em Belarus

Priyanka Shankar
28 de março de 2023

Vladimir Putin anunciou a instalação de armamento tático no país aliado. Especialistas em defesa alertam para a redução do tempo de resposta da Otan em caso de ataque.

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Teste de sistema Iksander na Rússia
Putin anunciou que instalará armas nucleares em BelarusFoto: Russian Defense Ministry via AP/picture alliance

As ameaças nucleares do presidente russo, Vladimir Putin, ganharam força no fim de semana, após ele anunciar que havia feito um acordo com o homólogo belarusso, Alexander Lukashenko, para a instalação de armas nucleares táticas em Belarus.

É a primeira vez desde meados da década de 1990 que Moscou instala armas fora da Rússia. Na declaração, transmitida pela televisão no sábado (25/03), Putin também disse que a Rússia concluirá a construção de um depósito para estas armas até julho em Belarus, embora não tenha especificado quando a transferência desses armamentos ocorrerá.

As preocupações com as crescentes tensões nucleares entre a Rússia e os EUA ressurgiram após Moscou suspender recentemente a participação no acordo New Start, o último pacto remanescente de controle de armas firmado entre os dois países. O tratado limita o número de armas nucleares estratégicas que cada país pode manter, mas não especifica números para armas nucleares táticas menores.

Não há informação exata sobre quantas armas nucleares táticas a Rússia possui atualmente. No entanto, de acordo com agência de notícias Reuters, os Estados Unidos estimam que sejam cerca de 2 mil ogivas táticas operacionais – aproximadamente 10 vezes mais do que Washington.

EUA dizem que não mudarão estratégia

Em resposta, os EUA disseram que não há indícios, até agora, de que a Rússia esteja se preparando para usar armas nucleares, mas que continuariam monitorando a situação.

"Não vimos nenhuma razão para ajustar nossa própria postura nuclear estratégica, nem nenhuma indicação de que a Rússia esteja se preparando para usar uma arma nuclear", comunicou o Departamento de Estado americano, acrescentando que o país continua "comprometido com a defesa coletiva da aliança da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan)".

Bruno Lete, membro sênior de segurança e defesa do German Marshall Fund, dos Estados Unidos, disse à DW que o anúncio de Putin não é uma surpresa para a Europa e a Otan. "Antes de tudo, isto faz parte de uma tendência maior do ano passado, na qual a Rússia intensificou sua retórica nuclear. E a Otan e a Europa estão preparadas", destaccou.

"Mas depois que a Rússia suspendeu o New Start, persistem as preocupações de que o país possa distribuir armas nucleares sem nenhum sistema de verificação. Isto não é bom para a paz e a segurança e seria melhor se este tratado ainda estivesse em vigor", acrescentou o especialista.

Veículo de guerra com uma ogiva
Sistemas de mísseis Iskander podem ser usados ​​para lançar armas nucleares táticasFoto: Russian Defence Ministry/picture alliance

O que são armas nucleares táticas?

As armas nucleares táticas são usadas para alvos específicos no campo de batalha e podem substituir as ogivas convencionais em sistemas de armas comuns. Elas não detonam sozinhas, precisam de um sistema de lançamento como os mísseis Iskander – sistemas de mísseis balísticos de curto alcance que a Rússia utilizou para lançar ogivas convencionais na Ucrânia e na Síria.

"As armas nucleares táticas são lançadas apenas para vencer uma batalha, e não projetadas para atacar uma cidade. São ogivas menores e podem chegar a 100 quilotons, dependendo do alvo", disse à DW William Alberque, diretor de Estratégia, Tecnologia e Controle de Armas do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, na sigla em inglês).

Já as armas nucleares estratégicas são intercontinentais e têm a capacidade de destruir uma cidade inteira.

"Estas armas podem ser disparadas, por exemplo, do território russo para atingir o território dos EUA. Assim, na Guerra Fria, para uma ogiva ser considerada estratégica, ela deveria ter a capacidade de ser lançada da Sibéria [na Rússia] para Montana [nos EUA]. São mais de 100 quilotons, ou pelo menos cinco vezes o tamanho das bombas de Hiroshima e Nagasaki, e podem causar muitos danos", explica Alberque.

Como isso afeta o acordo de não-proliferação de armas?

O Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP) limita a disseminação de armas nucleares a potências não-nucleares. Na declaração de sábado, Putin argumentou que o posicionamento de armas nucleares táticas em Belarus não violaria este acordo.

"Também não há nada de incomum aqui: os Estados Unidos têm feito isso há décadas. Há muito tempo eles colocam suas armas nucleares táticas no território de seus aliados", disse Putin, citado pela agência de notícias estatal russa Tass.

Sob o TNP, que entrou em vigor em 1970, Estados Unidos, Rússia, China, França e Reino Unido se comprometem em não fornecer a outros Estados nem materiais nem tecnologias para o desenvolvimento e a fabricação de armas nucleares. Os cinco países podem, no entanto, posicionar armas fora de suas fronteiras.

Putin destacou que a Rússia manteria o controle sobre as armas instaladas em Belarus, seguindo o acordo de não-proliferação. Atualmente, os EUA têm armas nucleares estacionadas na Europa, em países como Bélgica, Alemanha, Holanda e Itália.

Mulher segura foto de Putin e Lukashenko durante um protesto
Manifestantes belarrussos criticam os laços estreitos de Lukashenko com PutinFoto: Pavlo Gonchar/SOPA Images/Zumapress/picture alliance

Manutenção de armas dentro da esfera de controle

Segundo Stefan Scheller, membro associado programa de Segurança e Defesa do Conselho Alemão de Relações Exteriores, o envio de uma série de armas nucleares para alguns locais na Europa faz parte da estratégia de defesa coletiva da Otan.

"Existe um conceito da Otan chamado de 'compartilhamento nuclear'. Esta é uma política de dissuasão nuclear de longa data que garante que os benefícios, responsabilidades e riscos da dissuasão nuclear sejam compartilhados por toda a aliança. Ela visa garantir a segurança de seus aliados", explica.

Alberque compartilha uma visão semelhante e disse que as armas táticas que os EUA possuem são puramente projetadas para atingir formações de tropas ou pontos críticos da infraestrutura militar como as sedes militares dos centros de comando e controle. "Elas não são projetadas como armas estratégicas concebidas para atingir Moscou ou São Petersburgo ou algo parecido", afirma.

Com relação a Putin usar Belarus como uma plataforma de lançamento para armas nucleares táticas, Scheller destaca que a decisão foi anunciada unilateralmente por Putin, e não durante uma entrevista coletiva ao lado de Lukashenko.

"Este é um sinal claro de que Belarus está perdendo cada vez mais a soberania nacional", disse.

Nos últimos anos, Lukashenko reforçou os laços com Putin, o que o ajudou a manter uma fortaleza em Minsk em meio a protestos generalizados pedindo sua renúncia. Em 2022, Lukashenko também realizou um referendo após o qual foi aprovada uma nova constituição que abandonou o status não-nuclear do país.

Qual será reação da Otan?

De acordo com Lete, a Rússia instalar armas nucleares táticas em Belarus significa que Moscou poderia lançar um ataque no território da Otan muito mais rapidamente do que antes.

"Portanto, o tempo de resposta para a Otan agir será [mais curto]", disse ele. "Desta forma, ou a Otan continua a dissuasão nuclear, o que a aliança já está fazendo, ou a Otan pode se engajar em coerção nuclear, para desencorajar a Rússia a implantar armas em Belarus. Mas sob a situação atual, acho que a Otan continuará a dissuasão nuclear", acrescentou.