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Gastos militares globais atingem novo recorde em 2023

22 de abril de 2024

Instituto sueco Sipri registra aumentos em todo o mundo, impulsionados pela guerra na Ucrânia, situação no Oriente Médio e tensões entre China e Taiwan. Gastos na América Latina surpreendem pesquisadores.

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Militares poloneses participam de uma parada em Varsóvia
Na Europa, a Polônia é o país que percentualmente mais elevou seus gastos militaresFoto: Wojtek RADWANSKI/AFP

Os gastos militares globais em 2023 tiveram seu maior aumento percentual desde 2009, de 6,8%, chegando ao valor recorde de 2,4 trilhões de dólares, devido aos conflitos em andamento, segundo um relatório publicado nesta segunda-feira (22/04) pelo Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (Sipri).

Os gastos aumentaram em todo o mundo, mas os aumentos são mais notáveis na Europa, no Oriente Médio e na Ásia, de acordo com os autores do relatório. "Os gastos militares globais atingiram o pico e, pela primeira vez desde 2009, aumentaram em todos os cinco continentes", disse à agência de notícias AFP o pesquisador do Sipri Nan Tian.

Diante do atual cenário internacional de guerras, não chega a ser uma surpresa que os líderes em gastos militares – os EUA, a China e a Rússia – os tenham aumentado ainda mais.

Mas o que nem mesmo os pesquisadores do Sipri esperavam era que o maior aumento percentual de 2023 (de 105%) fosse num país como a República Democrática do Congo, com um conflito prolongado entre o governo e grupos armados não estatais. "O que nos surpreendeu foi o tamanho do aumento no resto do mundo, especialmente na América Latina e na África", disse o pesquisador do Sipri Xiao Liang à DW.

No México e em El Salvador, por exemplo, os governos estão usando as forças armadas para combater o crime organizado e a violência de gangues, e há tendências preocupantes semelhantes no Equador e no Brasil. Os gastos militares no Brasil aumentaram 3,1%, chegando a 22,9 bilhões de dólares.

"Portanto, o aumento em si não é muito surpreendente, mas a escala e a amplitude são. E, no que diz respeito à tendência global, provavelmente veremos um aumento ainda maior nos próximos anos se os conflitos e as tensões atuais continuarem", disse Xiao Liang.

Guerra na Ucrânia

O principal conflito a impulsionar o aumento de gastos militares continua sendo a guerra na Ucrânia após a invasão russa. Ela levou a um aumento dos gastos na Ucrânia, na Rússia e em vários países europeus. Na Rússia, a alta foi de 24%, chegando a 109 bilhões de dólares, de acordo com as estimativas do Sipri.

Já a Ucrânia elevou seus gastos militares em 51%, chegando a 64,8 bilhões de dólares, e o país ainda recebeu 35 bilhões de dólares em ajuda, principalmente dos Estados Unidos.

Embora os orçamentos militares dos dois países beligerantes sejam semelhantes, eles representam 37% do Produto Interno Bruto (PIB) da Ucrânia, de acordo com o relatório, e 5,9% do PIB da Rússia (o nível mais alto desde o fim da União Soviética).

Do ponto de vista econômico, a guerra é, portanto, um fardo muito maior para a Ucrânia do que para a Rússia. "A margem de manobra da Ucrânia para aumentar seus gastos é agora muito limitada", disse Nan Tian.

"Todos os membros da Otan, com exceção de três, aumentaram seus gastos. Além disso, 11 dos 31 membros da aliança militar atingiram ou até mesmo ultrapassaram sua meta de 2% do PIB com gastos militares, mais do que em qualquer outro momento desde o fim da Guerra Fria. Mesmo com a adesão da Finlândia e da Suécia, esperamos que mais países atinjam suas metas e que os gastos gerais dos países da Otan continuem a aumentar", declarou Xiao Liang.

O latente conflito entre China e Taiwan

Os números do Sipri também evidenciam um conflito latente que fez os gastos militares dispararam em 2023: o entre a China e Taiwan. Pequim elevou seus gastos com suas Forças Armadas em relação ao anterior em 6%, totalizando 296 bilhões de dólares, metade do que foi gasto em toda a região da Ásia e Oceania.

Em resposta, Japão e Taiwan também aumentaram seus gastos, em 11% cada, para 50,2 bilhões e 16,6 bilhões de dólares, respectivamente. A China está usando grande parte de seu crescente orçamento militar para aumentar a capacidade do seu Exército, diz Xiao Liang.

"Os gastos da China vêm aumentando há 29 anos consecutivos e de forma muito constante, a mais longa sequência de um único país. Em geral em paralelo ao crescimento econômico, sem relação com tensões geopolíticas ou crises globais como a guerra na Ucrânia ou a pandemia de covid-19. A modernização militar da China, por sua vez, leva países como Japão, Taiwan e Índia a também aumentarem seus gastos", diz Xiao Liang.

Gastos militares têm de novo prioridade

Outros fatos que chamam a atenção no relatório do Sipri: no Sudão do Sul, afetado pela violência interna e pela guerra civil, os gastos militares aumentaram 78% na comparação entre 2023 e o ano anterior. Diante da ameaça russa, a Polônia registrou o maior aumento entre todos os países europeus, de 75%, chegando a 31,6 bilhões de dólares. E o Irã está agora em quarto lugar no Oriente Médio, com seus gastos militares de 10,3 bilhões de dólares.

Para o cientista político Niklas Schörnig, do Instituto Leibniz de Pesquisa sobre Paz e Conflitos, a segurança militar voltou a ser uma prioridade em muitos países. Além disso, como mostram o exemplo da Ucrânia e os recentes ataques iranianos a Israel, defender-se é muito mais caro do que o atacar. Ele cita como exemplo os ataques com drones iranianos, tanto na guerra da Ucrânia como contra Israel. "O esforço de defesa contra eles é extremamente caro", observa.

Tendência deve se manter

Schörnig avalia que, diante da atual situação global, o desarmamento é um sonho muito distante. O mundo está numa nova era de armamento descontrolado, porque a maioria dos acordos de controle de armas não está mais em vigor ou foi suspensa. Isso faz com que países de todo o mundo se armem cada vez mais, numa espiral de crescente instabilidade.

Ele defende uma nova meta internacional: que os países se armem de forma controlada, até um determinado nível. "Isso eliminaria uma certa dinâmica. O controle de armas certamente poderia ser uma meta provisória, ou seja, controlar e estabilizar os armamentos para que nem todos se armem como bem entenderem."

É também muito provável que o próximo relatório do Sipri sobre gastos militares mostre novamente um novo aumento. Em 2023, a guerra na Faixa de Gaza e as tensões no Oriente Médio já levaram ao maior aumento de gastos na região nos últimos dez anos. Os gastos militares estimados no Oriente Médio aumentaram 9%, chegando a 200 bilhões de dólares. Somente os gastos militares de Israel – os segundos maiores da região, depois da Arábia Saudita – aumentaram 24%, chegando a 27,5 bilhões de dólares.

Schörnig tem, portanto, uma visão muito pessimista do futuro. "A menos que a situação política geral mude, não acredito que a tendência de aumento de gastos com armamentos será revertida."

Segundo ele, um retrocesso nos gastos só seria possível se houvesse uma paz na Ucrânia que não dividisse o país. No caso do conflito China-Taiwan, ele ainda espera que os EUA e a China possam controlar a situação por meio de negociações. "No momento, a atual situação global, e os números do Sipri refletem isso claramente, é extremamente perigosa", afirma.